quarta-feira, 30 de março de 2016

Vamos falar de pedaladas fiscais e operações de crédito?


Talvez você não saiba, mas se atrasou alguma conta de luz, cartão, telefone ou água, pagando em data posterior, com juro e multa, cometeu o que estão chamando por aí de pedalada fiscal. Não se acanhe, sei que foi apenas uma pedaladinha.
Nas administrações públicas, pedalada fiscal será crime, se os governantes não deixarem reservas financeiras em caixa, sobretudo no último ano de mandato. É uma precaução legal para que, numa eventual sucessão, o novo prefeito, governador ou presidente não tenha que arcar com as contas do anterior, isto é, sem que haja dinheiro para honrar compromissos financeiros já assumidos. Em dezembro de 2014, o governo federal tinha essa reserva.
Ao longo de 2014, contudo, o Tribunal de Contas da União, através de auditoria, verificou que o governo federal deixou de pagar bancos públicos, como a Caixa Econômica Federal e o Banco do Brasil, nas datas previstas e sucessivas. E concluiu: “essa dívida é pedalada fiscal”.
E mais do que isso, o Tribunal de Contas, contrariando entendimentos anteriores, considerou que esses atrasos, por serem volumes expressivos, não eram pedaladas fiscais, apenas. Os conselheiros passaram a entender que: “os atrasos eram verdadeiras operações de crédito, disfarçadas”. Bem, aí a coisa mudou de figura.
A mudança na interpretação produziu consequência jurídica relevante, pois operação de crédito necessita de autorização legislativa, isto é, ter aprovação do congresso, por lei. E incorre em crime, quem a realiza, sem a devida autorização.
Contudo, toda mudança de interpretação é sempre questionável. Quando passará a valer? O que é feito com os fatos passados? Quem deve ser punido pela conduta, o Ministro, o Secretário, o Presidente? É bem provável, portanto, que o judiciário deverá intervir, até que esse novo entendimento se torne pacificado.
Uma das maiores motivações que levou a mudança no entendimento do Tribunal de Contas da União decorreu do volume financeiro envolvido nestes atrasos. Explico. Quando o governo atrasava valores menores, o Tribunal de Contas não considerava operação de crédito disfarçada, mas simples pedalada. Daí, o volume aumenta e o TCU passa a considerá-los.
É como se pedalar 100 reais não fosse operação de crédito. Mas, 100 mil reais, sim! O mundo jurídico perguntar-se-á: o negócio jurídico muda em essência, se muda o volume e sua relevância? É isso que a justiça terá que responder. Em minha opinião, pedalada é sempre pedalada. Pode ser a do Robinho, com oito voltas sobre a bola, ou a minha, que mal consegue fazer duas.

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